Muita gente que vive na Austrália sonha em tirar um tempo para viajar pelo país e conhecer suas belezas naturais, mas nem todo mundo pode ou consegue. Não é o caso do casal Fernanda Faria e Shane Preston - ela, brasileira de São Paulo, ele, australiano de Sydney.
O par de biólogos marinhos, que se conheceu em Townsville e vinha morando em Brisbane, há muito tinha o sonho de tirar um sabático, colocar os filhos Rory, hoje com oito anos, e Luca, de seis, no carro e conhecer as maravilhas naturais da Austrália.
Mas não só isso - também queriam usar este tempo para fazer trabalho voluntário em reservas ambientais e centros de preservação de animais.
É precisamente isso que a família vem fazendo há quase um ano, desde março de 2022.

A família na divisa da Austrália Ocidental.
"Uma viagem de carro pela Austrália eu e o Shane queríamos a fazer há muito tempo, mas sempre tinha uma coisa que não era o tempo certo. Mas sempre surgia nos assuntos. E lembro de conversar com um amigo do trabalho, nossa, venho todo dia trabalhar e tenho a sensação de que o mundo está lá fora para explorar, e a gente aqui trabalhando… não chegou a virar realidade até que saí do meu trabalho e tive mais tempo de começar a pesquisar. Reli um livro de uma família australiana que deu a volta na Austrália."
O nome do livro é "Wrong Way Around", da escritora australiana Lorna Hendry.
"Não sei porque dessa vez virou realidade, a gente sentou, começou a olhar as nossas contas, quanto dinheiro a gente tinha, como a gente iria se organizar. E aí a gente se decidiu. Em março de 2022 vencia o contrato de aluguel de nossa casa em Brisbane e virou nossa data de partida. Isso era setembro de 2021. E a gente começou que tipo de equipamento precisava, a gente sabia que não teria dinheiro suficiente para fazer em uma caravan, então a gente optou por uma camper trailer, que é entre uma barraca e um caravan. Aí a gente comprou o carro que precisava, fomos aos poucos fazendo a lista."
A família comprou tudo que precisava para a empreitada em seis meses. E em março de 2022, Fernanda, Shane, Rory e Luca partiram com um roteiro flexível, tendo como referência apenas o fato de querer passar o inverno no norte e o verão no sul, porque eles não tem ar condicionado nem aquecedor no camper trailer.
"De Brisbane a gente seguiu pro norte, depois pro oeste, desceu pelo meio e agora estamos seguindo a costa de WA. A gente decide os locais que vai parar em cima da hora, não tem nada assim muito programado por antecipação. A gente tem uma ideia de lugares que quer visitar, e tem certos lugares que são melhores em certas épocas do ano. Por exemplo, o recife de Ningaloo tem que ir na época de seca, fora do verão, e também porque a gente quer ver os tubarões-baleia. A gente vai adaptando, mas no dia a dia é bem flexível. Tem os lugares que são icônicos que estavam na lista, o Uluru, Ningaloo. E aí tem os lugares que vai descobrindo ao longo da viagem, conversando com outras pessoas, a pesquisar cada região."
Trabalho voluntário
Fernanda e Shane queriam que a viagem fosse mais do que longas férias. Eles usam parte do tempo para fazer trabalho voluntário em conservação do meio ambiente, já que são biólogos. Também aproveitam para fazer contatos para oportunidades de trabalho no futuro. A possibilidade de trabalho voluntário, portanto, também influencia o roteiro da família.

Luca, Shane, Fernanda e Rory durante um dos trabalhos voluntários na viagem.
"Outro trabalho que a gente fez foi em um wildlife sanctuary, um lugar onde eles cuidam de animais selvagens que foram atropelados, ou que perderam a mãe, ou tentam reabilitar. Tinha canguru, emas, vombates. Ajudamos a cuidar da horta, até Rory e Luca deram mamadeiras para os joeys".
Viajar com crianças não é fácil. Perguntei à Fernanda como os meninos estão lidando com a viagem. Ela respondeu que, como adultos, eles têm dias bons e ruins, e que a convivência intensa tem lá seus percalços - por exemplo, quando um está de mau humor, acaba passando para os outros.

Rory e Luca durante o homeschooling.
"A escola dos meninos é na estrada. Cada estado tem suas regras e a gente está registrado por Queensland. Aqui na Austrália tem muita estrutura pra isso. O é deixado totalmente aos cuidados dos pais. No início do ano a gente tem que fazer um plano de ensino, e no fim do ano, tem que fazer um relatório de como progrediu. Não é fornecido nenhum material, nada. Fica a critério dos pais fazer todo o ensinamento. A gente aproveita as situações do dia a dia para ensinar diferentes coisas. Por exemplo, quando a gente visita um centro cultural, aprende sobre a história indígena."
Os lugares incríveis
Perguntei ao casal sobre os melhores lugares que visitaram até aqui. Fernanda Faria cita o Uluru como um lugar mágico.
"Lugar especial tiveram muitos. É muito difícil escolher o lugar mais legal. Pra mim, o Parque Nacional do Uluru é mágico. Tem uma vibe muito legal, uma cultura, uma história, além de ser muito bonito. A gente aprende sobre a cultura indígena local, a geologia. Por enquanto, talvez seja meu favorito. Tem também o Parque Nacional do Purnululu, onde ficam os Bungle Bungles. É maravilhoso, é uma geologia totalmente diferente de qualquer coisa que já vi, muitas coisas pra ver, super interessante."

A família Faria Preston no Uluru que, segundo Fernanda, é um lugar mágico.
"Um lugar que a gente nem conhecia que é Lawn Hill National Park, a oeste de Brisbane. A gente estava em dúvida, estava longe de onde íamos. As pessoas que diziam que era bom. E foi sorte a gente ir pra lá, foi um dos meus lugares favoritos. O rio de cor esmeralda, as pedras laranjas e vermelhas, o céu azul brilhante. Muita vegetação de beira de rio, a gente fez caiaque, passamos o dia no rio. Até agora foi um dos meus favoritos."
Há perrengues? Óbvio que sim
Claro que uma viagem rústica destas haveria de ter lá seus perrengues. Shane conta que a caminhonete deles não aguentou atravessar um rio.
"O maior perrengue que a gente teve foi por causa do carro. A gente atravessou um riozinho e teve um problema com esse modelo de carro, porque o ventilador é bem perto do radioador, e estourou o radioador. Perdemos todo o fluido. Por sorte a gente estava só a 60km da cidade de Borroloola (NT). Tinha mecânico lá, o guincho buscou a gente e teve que passar uma semana neste lugar para esperar outro radioador."

O carro e o camper trailer da família durante o giro pela Austrália.
Se sonha em fazer uma viagem parecida com a deles, Shane e Fernanda têm dicas. O australiano diz que é melhor se você não tiver pressa.
"Pra mim a melhor dica é ir devagar. Você não precisa ver tudo. Dependendo do tempo que você tem, é melhor passar mais tempo num lugar do que ir em três ou quatro lugares. A gente precisa ficar num lugar ao menos quatro ou cinco noites, não vale a pena ficar por duas noites. É melhor ir devagar, curtir tudo o que o lugar tem, encontrar mais pessoas. (Muito melhor ir devagar, vai encontrar muito mais pessoas e curtir bastante."

O roteiro da família neste quase um ano de viagem.
"Se tem vontade, senta, se programa e vai, porque a hora é agora. Enquanto tá na estrada, aceite que as coisas não vão sair do seu jeito o tempo todo. Pra mim foi um grande aprendizado, eu gosto de ter organizado e controlado e na estrada não dá pra ser assim. E outra dica é baixar o seu standard: você não vai tomar banho todo dia, a sua louça não vai estar limpinha porque tem que economizar água. Mas vale a pena, você vai curtir esses lugares de uma forma que só nas férias escolares não dá."
Você pode acompanhar as aventuras da família Faria Preston no site ou no canal do Youtube .
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