'Consegui na justiça fazer o pai do meu filho assinar autorização de viagem'

Mãe e filho no aeroporto

"Quando pedi ao pai para assinar os documentos para autorização de viagem do nosso filho, e ele se negou,” conta Helena. Credit: RyanJLane/Getty Images

O caso de Helena* é emblemático e representa a situação de muitas brasileiras que se separam de seus companheiros ou maridos na Austrália e precisam sair do país temporariamente, com os filhos, para visitar um ente querido ou a família, no Brasil.


Resumo da Notícia
  • Na Austrália, os pais tem o mesmo direito de determinar o local de residência da criança.
  • Sem a autorização do pai da criança, a brasileira Helena foi à justiça da família para conseguir sair da Austrália.
  • Pelas leis brasileiras o pai ou mãe ausente também têm que autorizar a saída do Brasil para outro país para não caracterizar sequestro.
*nome verdadeiro foi omitido a pedido da entrevistada

Os problemas começaram quando Helena* engravidou.

“Conheci meu ex-companheiro em 2017, ficamos juntos por um ano e fiquei grávida. Ele é australiano e quando engravidei, ele não quis assumir a paternidade. A gente acabou se separando.”
mãe e filho no aeroporto
Separada, com um bebê no colo e sem status de residente permanente ou cidadã, Helena, diz que na época não recebeu nenhum auxílio do governo. Source: iStockphoto / kieferpix/Getty Images/iStockphoto
Helena recorda que não teve nenhum apoio, emocional ou financiero, o ex-companheiro se recusou a pagar a pensão. Só depois que a criança nasceu, prematuramente, foi que começou a se reaproximar e assumir a paternidade.

Separada, com um bebê no colo e sem status de residente permanente ou cidadã, Helena, que tinha um visto de estudante, diz que na época não recebeu nenhum auxílio do governo.

Foi um dos momentos mais difícies de sua vida.
Vim para Austrália como a maioria das pessoas vêm, com um visto de estudante. Quando houve a separação eu fiquei sem chão. Voltar ao Brasil poderia ser uma opção, mas a gente sabe que a Austrália é um país maravilhoso e eu queria criar meu flho aqui.
Helena
Quando seu filho nasceu, Helena que já tinha iniciado o processo de migração, recebeu a residência permanente. Depois conseguiu a cidadania australiana.

Chegou o momento então que teve que ir ao Brasil por questões familiares.
“Eu queria muito ir visitar minha família. Queria muito que meu filho conhecesse a família dele. Quando pedi ao pai para assinar os documentos para dar entrada no passaporte brasileiro do nosso filho, e ele se negou.”

Esse foi o momento em que ‘tudo’ começou, diz Helena; uma batalha judicial que teve grande impacto na sua saúde física e mental e para a qual ela não estava preparada financeiramente.

O problema não era só conseguir o passaporte para sair da Austrália, mas também sair do Brasil com a criança sem a autorização de viagem assinada pelo pai.
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Sem a autorização do pai da criança, a brasileira Helena teve que ir à justiça da família para conseguir sair da Austrália e depois conseguir sair do Brasil.
O Brasil não permite que crianças saiam do país sem a presença dos dois pais ou autorização do pai que não está viajando.

“Eu comecei a correr atrás de informações de como eu poderia ir viajar mesmo com ele [pai da criança] não autorizando.”

Helena conta que primeiro, teve que esgotar todas as vias normais para emissão da autorização de viagem.

Só depois o caso pode ser levado para o Tribunal da Família.

“O pai alegava que eu poderia sequestrar o nosso filho e não retornar para a Austrália,” recorda, que no início trabalhou com um advogado.

Mas após todo o dinheiro que tinha economizado, cerca de AU$8 mil, ter sido gasto no processo, resolveu, ela mesma, assumir o caso e se auto representar legalmente nas audiências com o juiz.

Com a ajuda de ONGs e apoio legal gratuito, além do apoio até dos vereadores da região onde mora, Helena ficou a par de tudo o que precisava para ter o direito de ir e vir e reclamar na justiça a autorização de viagem do pai.
DIVORCE
Pelas leis brasileiras o pai ou mãe ausente também têm que autorizar a saída do Brasil para outra país para não caracterizar sequestro. Source: Pixabay
“Tive três audiências, em uma delas a juíza disse que eu teria que depositar uma ‘caução’ que poderia chegar a AU$100 mil para sair da Austrália – como mecanismo de segurança para garantir meu retorno.

“Foi tudo muito cansativo emocionalmente, financeiramente. Meu ex-companheiro chegou a alegar que eu poderia sequestrar o filho dele se eu fosse para o Brasil.”

Depois foi calculado, segundo Helena, que o valor para ela ficaria entre AU$70 e AU$75mil.

“Fiquei deseperada, não sabia de onde ia tirar esse valor. Mas não perdi a esperança. Eu sabia que na próxima audiência, com outro juiz, eu poderia ter um olhar diferente sobre a situação e foi o que realmente aconteceu, a juíza pediu um relatório de uma psicóloga especializada em crianças onde ela ia dizer se a viagem era boa para a criança, tendo em primeiro lugar os interesses da criança.

“Me pediram então um depósito/caução de AU$25 mil, um valor que consegui arrecadar por empréstimos com amigos e familiares, e assim a juíza me autorizou a viajar. Com isso, consegui fazer com que ele assinasse os formulários para o passaporte australiano. Também fiz um atestado de residência junto à Embaixada do Brasil na Austrália, comprovando que a residência da criança é aqui, em Queensland, senão também não ia conseguir voltar do Brasil.
Của anh, của tôi, hay của chúng ta?
Credit: Image of Courtesy
Helena finalmente realizou a viagem e conta que ainda não recebeu o dinheiro da caução de volta. Mas está confiante que isso lhe será retornado.

“Te confesso que durante todo os 12 meses que isso me levou, eu muitas vezes pensei em desistir porque o esgotamento emocional é muito grande, você não dorme. Você está sozinha, você não sabe como que as coisas vão se resolver.
Mas o apoio de meus amigos e família me deram forças para prosseguir. Também me disponho a ajudar outras imigrantes que como passaram por esse conflito. Minha mensagem é para elas não desistirem.
Helena
Hoje Helena conta que o ex-companheiro paga pensão e a guarda é compartilhada. “Terminou a causa eu podendo viajar a cada dois anos sem precisar fazer depósito judicial. Ficou combinado que a cada ano o passaporte fica com um de nós.”

**Todas as fotos dessa reportagem são para efeito de ilustração apenas.

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