Resumo
- A escritora e jornalista Nadia Heisler, de Perth, alerta brasileiros recém-chegados na Austrália investirem no aprendizado do inglês.
- Ela fala como conseguiu realizar seus sonhos 'negando suas raízes', mas que o fez de maneira radical.
- Nadia destaca que ao se tornar mãe, voltou a abraçar a língua e cultura brasileira.
Ao chegar em Sydney, em 2011, Nadia ouviu de seu professor que seu inglês não estava melhorando e resolveu se afastar dos brasileiros na Austrália e como ela mesma diz, ‘negar suas raízes’.
“Eu tinha 23 anos e me matriculei em uma escola de inglês cheia de sul-americanos. Ia para as baladas quase todos os dias, até que um dos meus professores disse:
‘Seu inglês não está melhorando. Se você quer aprender um novo idioma, fique o mais longe possível das pessoas que falam o seu idioma.’
“Então, para me afastar de pessoas que falam a minha língua, decidi me mudar para a cidade, a meu ver, mais isolada do mundo: Perth. Meu plano era dominar o inglês, e conseguir um bom trabalho,” recorda.

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“Não entendia nada dos pedidos, pois a clientela era bem local e tinha um sotaque australiano bem forte. Mas fui aprendendo e fazendo dinheiro.”
“Aos poucos, fui me apaixonando – não por nenhum namorado, mas pela incrível cidade de Perth. Parecia tão promissor. Cada pequeno bairro estava se expandindo, os jovens estavam comprando casas, a indústria de mineração estava crescendo. Senti que Perth estava evoluindo comigo e não queria mais sair de lá,” recorda.
Por meio do trabalho e estudando oito horas por dia, Nadia conseguiu pagar as contas e cursar a universidade de Recursos Humanos. Ela foi reconhecida e ganhou até prêmio de melhor estudante do ano na faculdade. “Tenho muito orgulho daquela época,” conta.
Mas o conselho ‘daquele professor’ ficou com Nadia e continuou ditando suas ações por muito tempo.
“Eu não tinha amigos brasileiros próximos e raramente falava minha língua. Não lia livros nem assistia filmes em português,” diz.
Uma das minhas amigas brasileiras gosta de lembrar como nos conhecemos naquela época: aparentemente, eu disse a ela que ‘ela era legal, mas que eu não andava muito com brasileiros.’Nadia Heisler
Em 2015, Nadia conseguiu um emprego como coordenadora de recrutamento em uma grande empresa e lá conheceu o marido australiano.
Sete anos depois virou mãe.
Foi aí que a decisão de radicalmente reduzir ao mínimo o português da sua vida e praticamente eliminá-lo do seu dia-a-dia, voltou a atormentá-la, ela que era agora mãe de primeira viagem em um país estrangeiro.

Ser mãe mudou e a necessidade de se conectar com o filho fez Nadia voltar a abraçar a cultura e música brasileiras.
“Quando meu filho tinha oito semanas, levei-o à aula de hidroterapia para mães e bebês. Todas ao meu redor cantavam: ‘Humpty Dumpty sat on the wall…’ e outras canções de ninar tradicionais australianas. Mas eu não conhecia os ritmos, as letras ou significado, pois não havia crescido com elas.
“Eu invejava a ligação das outras mães com seus bebês e via como isso era forte através das músicas. Eu ansiava pelo mesmo. Quando voltei para casa, baixei essas canções de ninar no Spotify e tirei screenshots de suas letras. Eu estava pronta, mais uma vez, para assimilar totalmente a cultura australiana e abandonar minhas raízes brasileiras.”

Hoje Nadia é defensora do bilingualismo, criou um grupo de mães no Facebook e até o marido está conversando com o bebê em português.
“Comemorei meu aniversário de 35 anos com meu filho, meu marido e a família dele. Fiz questão de cantar “parabéns” para mim mesma em português. Eu cantei sozinha, rostos vazios olhando para mim. Quando terminei, ninguém bateu palmas, ninguém gritou: ‘E pra Nadia, nada. Tudo, tudo.’
“Naquele dia, percebi que não queria mais dar as costas às minhas raízes brasileiras. Decidi refazer meus passos, coletando cada memória e todas as palavras que deixei para trás.’”
“Parte de mim sentiu como se estivesse retrocedendo, e a outra parte se sentiu envergonhada por ter negligenciado minha cultura por tanto tempo.”
“Postei no grupo Mães Brasileiras no Facebook, pedindo sugestões de músicas brasileiras para ouvir com meu filho. Baixei todas as playlists recomendadas e agora meu filho e eu ouvimos essas músicas todos os dias.”
Hoje Nadia é defensora do bilingualismo, criou um grupo de mães no Facebook e até o marido está conversando com o bebê em português.
Ao terminarmos a entrevista eu questionei se Nadia estava agora “em paz” com as duas culturas se ambas agora conviviam em harmonia em sua vida.
“Ainda não,” ela responde, pensativa, “é um trabalho contínuo.”
Para ouvir a entrevista completa, clique no 'play' nesta página, ou ouça no perfil da SBS Portuguese no seu agregador de podcasts favorito.
Esse artigo escrito reproduz trechos do texto em inglês escrito por Nadia Heisler para a SBS Voices. Para acessá-lo, clique .
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