O busto dele aparece-nos como um emblema da música, Da tradição culta da mais prodigiosa música clássica, surge-nos como um leão com juba farta, encaracolada, Feição vincada, como que esculpida, O olhar, profundo, Podemos imaginá-lo atormentado. A surdez que o impedia de escutar as peças de extraordinária densidade expressiva que criava – e que 250 anos depois nos estremecem - tem de ter sido uma tormenta. Atormentado mas também exaltado, consciente da grandeza do talento, libertado em sucessivas vagas – podemos imaginar, fúrias – de génio.
Ele é Ludwig van Beethoven, o génio que nas nove obras-primas sinfónicas ampliou a noção de sinfonia – elas são pilar da cultura universal.
Valente, audacioso, ele deixa-nos criações vigorosas, plenas de energia que levantam a esperança.
Exemplo máximo a Quinta Sinfonia. A grandeza está em todos os fragmentos melódicos. Leonard Bernstein, numa daquelas inesquecíveis conversas sobre música nos concertos para jovens que conduziu para a CBS, mostrou-nos como as quatro primeiras notas da quinta sinfonia são como o trampolim que lança, que aconchega, a preciosidade sinfónica que vem a seguir.
Beethoven tem, nestes dois séculos e meio, impacto revolucionário sobre a música.
Também é uma personagem lendária: as sucessivas maleitas, a surdez e a quase cegueira que não lhe quebraram a criação; os sobressaltos da vida pessoal, sobretudo a amorosa, tantas vezes frustrada; o caráter que nos chega fogoso; o culto da liberdade, a paixão da natureza, caraterizam uma figura que é um colosso de sempre.
O génio com esta fúria da natureza humana nasceu há precisamente 250 anos. Foi batizado em Bona em 17 de dezembro de 1770.
17 é amanhã.
Mas os historiadores dizem-nos que o ritual do tempo levava a que o batismo acontecesse logo no dia seguinte ao do nascimento, que teria sido, portanto a 16 de dezembro.
Não há certezas, mas admite-se que Ludwig van Beethoven tenha nascido em 16 de dezembro de 1770.
Há, faz hoje, 250 anos, data redonda que merece toda a celebração.
Ludwig nasceu de uma família de músicos – mas desafortunada. Aos 22 anos, trocou Bona por Viena, a capital do poderoso império Austro-húngaro – queria conhecer Mozart, mas chegou tarde, já tinha passado o requiém por esse outro génio. Mas ficou sob a tutela de outro grande, Joseph Haydn.
Aquele era um tempo de grande sobressalto na Europa.
Os revolucionários franceses tinham-se levantado contra o poder divino do rei, Napoleão tinha passado de líder da aspiração de liberdade, igualdade, fraternidade, a déspota – o medo, o terror alastrou por meia Europa.
Beethoven tinha planeado dedicar a Napoleão a Sinfonia nº3, a Heróica, mas riscou o nome dele da partitura quando em 1804 Napoleão se proclamou imperador. Dez anos depois, na derrota de Napoleão frente aos aliados, Beethoven compôs A Vitória de Wellington, e foi um triunfo! Antes, em 1804, já tinha escrito Fidélio, única ópera dele, também uma ode à luta contra a arbitrariedade, tal como em Egmont, onde conjuga a música com o texto de Goethe e, claro, a Nona Sinfonia que veio a ser em 1985, hino oficial da Europa Unida – e também hino da liberdade. É a música que os estudantes da praça Tiamamen, de Pequim, entoaram quando os tanques avançaram naquele junho de 89.
Também podemos escolher a 6ª Sinfonia, a Pastoral, que nos leva à relação entre o Homem e a Natureza.
Quando renasce a esperança de prioridade à emergência climática, aí pode estar um hino para a ação.
Composto por um visionário, humanista, colosso de todos os tempos.