O HIV (Human Immunodeficiency Virus) é o vírus da imunodeficiência humana. Ele pode ser transmitido por relações sexuais sem preservativo, compartilhamento de seringas contaminadas e, no caso de gestantes sem tratamento adequado, para o bebê durante a gravidez, parto ou amamentação.
A SBS em Português entrevistou dois brasileiros que vivem com HIV aqui na Austrália - Augusto, que mora em Brisbane há oito anos, vive com HIV há mais de dez anos, e recebeu o diagnóstico enquanto ainda morava no Brasil. Já a Carolina, que vive em Byron Bay há cinco anos, teve o resultado positivo há dois anos. Para proteger a privacidade de ambos, seus nomes foram alterados.

Para aqueles que vivem com o HIV, o estigma ainda existe. Source: Getty / Getty Images
Em 2014, ainda no Brasil, Augusto, que se identifica como homossexual, apresentou sintomas como diarreia e candidíase. Ao fazer diversos exames, incluindo o de HIV, o primeiro teste deu negativo, mas, com a persistência dos sintomas, ele refez o exame.
Porém, desta vez, o resultado só foi notificado após três meses, agravando ainda mais o seu estado de saúde.
“Eu fui definhando aos poucos. Tinha dias que conseguia ir trabalhar; e outros não, pois me sentia muito fraco e sem energia. A minha mãe e o meu irmão ficaram preocupados com o meu estado de saúde e decidiram ir diretamente ao laboratório para saber o por que da demora de três meses.
"Foi aí que eles foram informados que o meu resultado para HIV era positivo. Na mesma hora o meu irmão me ligou para dar a notícia. E foi assim que começou a minha jornada como uma pessoa vivendo com HIV ainda no Brasil, ” recorda.
Carolina, que se identifica como heterossexual, decidiu fazer o teste de HIV em Nova Gales do Sul após descobrir que seu namorado, com quem mantinha um relacionamento estável há dois anos, a estava traindo por meio de um aplicativo de encontros sexuais.

ONGs ao redor do mundo fazem campanha para incentivar as pessoas a se informarem e cuidarem da saúde, além de reforçar que o HIV não causa limitações à vida. Credit: Ayo! Kit Bicara HIV/AIDS
A minha descoberta foi chocante e inesperada. Eu fiz os exames e isso mudou a minha vida para sempre, pois o resultado foi positivo para o HIV.Carolina
Carolina, relatou o período difícil na sua vida ao receber o resultado positivo.
“Eu senti como se o chão estivesse desaparecido sob os meus pés. Eu não tinha nenhum conhecimento sobre o HIV. Eu passei por um período de angústia intensa e até mesmo pensamentos suicidas. A Carolina feliz e radiante desapareceu naquele momento. Eu estava com um visto de estudante e achei que era o fim de tudo - o fim da minha jornada e o fim do meu sonho australiano”.

Positive Life NSW é uma ONG que ajuda pessoas vivendo com HIV Source: Getty / Getty Images
“O suporte médico é fundamental para garantir que o tratamento adequado seja iniciado o mais rápido possível. Já o apoio psicológico também é vital, pois o diagnóstico pode ser devastador. Eu recomendo que as pessoas procurem profissionais bem informados sobre o HIV, para evitar que o trauma se agrave ainda mais”, disse Carolina no podcast.
“Eu recomendo muito os serviços do . Lá eu conheci médicos e enfermeiras que me trataram com muito carinho, e passei a receber gratuitamente o tratamento quando eu ainda era estudante internacional. Me foi oferecido até um intérprete para traduzir as informações, pois na época, eu ainda não me comunicava bem em inglês”, lembra Augusto.

Um 'Embaixador do HIV' no Mardi Grass, o crnaval em Sydney Source: AAP
Pessoas que fazem o tratamento antirretroviral corretamente se tornam indetectáveis, ou seja, a carga viral fica tão baixa no organismo que passa a não ser mais detectável.
Desta forma, elas não transmitem mais o vírus, mesmo que tenham relações sexuais sem o uso de preservativo, além de passarem a ter uma vida totalmente saudável. Inclusive, é possível engravidar ou amamentar sem que o vírus seja transmitido para o bebê.
Tanto o Augusto quanto a Carolina estão indetectáveis no momento.
O HIV não te impede de estudar, trabalhar ou viver na Austrália
Sim, é possível migrar para a Austrália como estudante internacional e ainda conseguir a residência permanente caso você seja uma pessoa vivendo com HIV. O mais importante é procurar por um agente de imigração qualificado.
Segundo o Augusto, “Eu procurei uma agente de imigração brasileira e ela me disse que seria impossível uma pessoa com HIV conseguir a residência permanente na Austrália. Inclusive, ela foi bem esnobe e não me tratou com atenção ou de maneira respeitosa”.

O HIV não impede de estudar, trabalhar ou viver na Austrália
A Carolina também relatou o processo para a solicitação da sua residência permanente. “Eu sou residente permanente e pretendo solicitar a cidadania em breve. O processo de visto não foi fácil. Para alguém vivendo com HIV, é necessário solicitar uma dispensa de saúde, ou health waiver, o que significa que a aplicação inicialmente pode ser negada, e depois passa por uma revisão do governo, considerando o custo do tratamento”.
“Eu consegui o meu visto com o apoio do meu médico, que confirmou que sou indetectável, e de um advogado especializado. Juntos, conseguimos demonstrar que a minha condição de saúde não afetaria minha capacidade de contribuir para o país”, disse ela.

“A vida não acaba quando você descobre ter HIV. Ela apenas recomeça,” diz Carolina. Source: AAP
Em um relacionamento sorodiscordante, um dos parceiros vive com HIV e o outro não. Augusto e Carolina estão em relacionamentos sorodiscordantes, onde seus atuais parceiros não vivem com HIV.
Augusto contou para o seu namorado, ainda em 2017 quando o conheceu, que era uma pessoa vivendo com HIV.
“Quando contei da minha sorologia, ele disse que não se importava com isso e que me amava da mesma forma. O mais importante é que eu continue a fazer o meu tratamento e, assim, poderíamos ter uma vida completamente normal, sendo ambos saudáveis e felizes”.
Segundo a Carolina, “Logo após o meu diagnóstico, eu iniciei um relacionamento afetivo com um homem que não vive com HIV, e ele foi fundamental no meu processo de recuperação. Ele cuidou de mim quando eu estava deprimida por causa do diagnóstico e foi ele quem me educou sobre o HIV. Ele me fez perceber que o HIV não define quem eu sou, e que o nosso relacionamento poderia ser completamente normal, desde que eu faça o meu tratamento médico”.
É possível engravidar seguramente sendo uma mulher que vive com HIV

O tratamento adequado com acompanhamento médico possibilita uma gravidez segura tanto para a mãe quanto para o bebê. Credit: Digital Vision
“Eu estou muito empolgada para ter filhos! Isso é possível e seguro, de acordo com a medicina e a ciência, porque eu tomo uma medicação diária que suprime o vírus, o tornando indetectável no meu corpo, o que significa que não transmite o vírus ao bebê”.
“A vida não acaba quando você descobre ter HIV. Ela apenas recomeça”
A SBS em Português pediu no final do podcast para que o Augusto e a Carolina mandassem um recado para quem acabou de descobrir que é HIV positivo. Nas palavras de Augusto, “Eu levo uma vida normal desde que descobri ser uma pessoa vivendo com HIV há aproximadamente 10 anos atrás. A vida não acaba quando você descobre ter HIV, ela apenas recomeça”.
“Não me vejo diferente de qualquer outra pessoa sorodiscordante nem me sinto mais frágil que elas. Contudo, tenho consciência da minha condição de saúde e tomo meu remédio todos os dias na hora certa, faço exercícios físicos para melhorar o meu condicionamento físico e também ajudar no tratamento”.
“Acredito que cada pessoa processa o diagnóstico de HIV diferentemente. Entretanto, é preciso ter consciência de que hoje em dia a doença é controlada e a pessoa pode ter uma vida normal como qualquer outra. Para que isso aconteça, é importante aderir ao tratamento corretamente e fazer os exames regularmente”.
Carolina reforçou essa mensagem ao afirmar que, embora o diagnóstico possa ser um choque no início, é possível levar uma vida saudável e plena com o tratamento adequado.
“Eu diria que, embora o choque possa ser imenso e o futuro parece incerto, existe vida após o diagnóstico. Você pode voltar a brilhar novamente. Estar sempre bem informado sobre o seu estado de saúde abre a porta para tratamentos eficazes que podem ajudá-lo a viver uma vida longa e saudável. A mensagem que trago é de esperança: sim, é possível viver uma vida completamente normal, mesmo com o HIV. E nunca se esqueça: os testes regulares são a melhor forma de cuidar de si mesmo e dos outros”.
Pessoas vivendo com HIV na Austrália podem encontrar suporte, tratamento médico gratuito e serviços especializados em diversas organizações espalhadas pelo país.
Confira a lista abaixo:
Queensland - Queensland Positive People (QPP) ou Queensland Council for LGBTI Health
Território do Norte - NAPWHA Peer Support (National Association of People with HIV Australia)
Austrália do Sul - SAMESH (South Australia Mobilisation + Empowerment for Sexual Health)
Tasmânia - Tasmanian Council on AIDS, Hepatitis and Related Diseases (TasCAHRD)
Canberra - HIV/AIDS Legal Centre (HALC) ou Canberra Sexual Health Centre
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