Destaques
- Bella e Giovana são apaixonadas por futebol desde crianças. Depois de se conhecerem, o esporte sempre esteve muito presente no relacionamento delas
- Quando chegaram na Austrália, seis anos atrás, elas jogaram futsal e depois partiram para o campo. Hoje atuam no Western Strikers, em Adelaide
- Essa entrevista com a Bella e a Giovana integra a série de podcasts "Lugar de mulher é em campo", sobre a importância do futebol na vida de mulheres imigrantes
Até que ponto a paixão de alguém por um esporte pode se fazer presente no seu relacionamento amoroso? Dependendo da importância do esporte na vida da pessoa, a relação afetiva pode ser pautada por atividades totalmente voltadas para a modalidade esportiva.
Quando falamos de futebol, é comum ver casais brasileiros em que ambos assistem, praticam, levam a sério e priorizam o esporte mesmo nos momentos de lazer. Quando a torcida é por clubes diferentes ou uma das partes opina no jogo da outra, podem até acontecer algumas discussões. Mas no geral, o amor pelo futebol une ainda mais um casal.
Futebol presente desde o início do relacionamento
Bella e Giovana se conheceram no trabalho, ainda no Brasil, e já nas primeiras conversas descobriram a paixão em comum pelo futebol. O esporte as aproximou, já que começaram a assistir juntas aos jogos dos seus times e uma acompanhava a outra na hora de praticar. Nascia ali uma história de amor completamente ligada ao futebol.
“A gente trabalhava juntas na mesma empresa, mas em estados diferentes. Tínhamos bastante contato por conta do trabalho. Conversando sobre coisas em comum, percebemos que o futebol estava presente. Uma coisa levou à outra e aqui estamos. (risos)”, conta Giovana.
“Quando nos encontrávamos, nossos programas eram sempre ligados ao futebol, como ir ao estádio assistir aos jogos juntas. Você ter uma pessoa que compartilha de um hobby, de uma paixão que envolve tantas emoções, eu acho que foi bem importante para a gente se conectar no começo da nossa relação”, destaca Bella.
Compartilhar de uma paixão que envolve tantas emoções foi importante para a gente se conectar no começo da nossa relação.Bella Santiago, Assistente Técnica do Western Strikers, Adelaide
Viciadas em futebol
“A gente é o tipo pessoa que acorda às 3 da manhã para ver jogo de futebol. Volta do trabalho, vai pro futebol. Chega em casa falando de futebol, vê se por acaso não tem algum jogo passando na TV ou na internet, se não tem nada a gente olha os highlights do youtube dos jogos passados e aí a gente vai dormir. Então o futebol é bem importante para a gente”, brinca Bella.
“Ah, e quando não tem jogo a gente joga futebol no videogame (risos)”.
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Bella e Giovana tem o futebol na rotina delas sete dias por semana, seja no campo, na torcida ou até mesmo nos momentos de lazer. Source: Supplied
Já Bella é natural de Curitiba, no Paraná, passou a infância em Itajaí, Santa Catarina, e viveu boa parte de sua adolescência nos Estados Unidos. As constantes mudanças de cidade, porém, nunca foram um empecilho para a relação com o futebol.
“Eu não lembro como começou [a relação com o futebol]. Já nasci e cresci respirando futebol. Meu pai é colorado [torcedor do Internacional] doente, então eu naturalmente sou também. Mesmo vivendo fora de Porto Alegre por muitos anos, eu acompanhei bastante o Inter. O irmão do meu avô jogou no Grêmio. Então o futebol esteve muito presente”, explica Giovana.
“Comecei jogando futsal, de forma amadora, com amigas ou competindo no colégio, por volta dos 14 anos, em Salvador, e depois participei de alguns times de futsal em Porto Alegre”.
Eu não lembro como começou [a relação com o futebol]. Já nasci e cresci respirando futebol.Giovana Bruno, Atacante do Western Strikers, Adelaide
Bisneta do ex-jogador Zinder Lins, ídolo do Athletico Paranense nos anos 30 e marcado na história por ter escrito o hino do clube, Bella também se viu apaixonada pelo futebol pelas raízes familiares.
“O meu início no futebol é parecido com o da Gio. Minha família sempre esteve muito envolvida com futebol. Joguei desde criança no colégio e na rua com amigos e meu irmão mais velho. Com 11 para 12 anos me mudei para os Estados Unidos e comecei a jogar no time da escola. Tive uma lesão no tornozelo e parei, fui para outros esportes, mas já adulta quando voltei para o Brasil, em 2011, eu fui pro futsal e voltei a focar no futebol”.
Mudança para a Austrália
Há mais de seis anos na Austrália, elas contam que a decisão de vir para o país foi conjunta, pela experiência que ambas tiveram com a vida no exterior, e que o futebol foi uma das primeiras coisas em que procuraram para ajudar na adaptação à nova casa.
“Por eu ter crescido fora do Brasil, tinha vontade de morar fora novamente, mas não pensava nos Estados Unidos. A Gio já tinha morado na Austrália por 3 meses e gostava muito daqui, tinha vontade de voltar. A Austrália pareceu ser uma opção que unia o que a gente tinha de perspectiva de estilo de vida e também a oportunidade de, através dos cursos de aprimoramento, dar um passo a mais na nossa carreira. Viemos com a intenção de ficar cinco anos, já estamos há seis anos e meio, e não pretendemos sair mais”, diz Bella.
“Quando a gente chegou, uma das primeiras coisas que fizemos foi procurar como jogar futsal. Então a Bella conseguiu por contatos de trabalho e facebook, e achou uma federação de futsal. No primeiro ano que estávamos aqui jogamos um State Futsal League, mas foi bem introdutório pra gente. Era o primeiro ano de Austrália, focamos mais nos estudos, trabalho e carreira, mas depois a gente se juntou com umas brasileiras que ao longo dos anos foram chegando e começamos a jogar para nos divertir”, explica Giovana.
Quando a gente chegou [na Austrália], uma das primeiras coisas que fizemos foi procurar como jogar futsal.Giovana Bruno, Atacante do Western Strikers, Adelaide
Das quadras para o campo
Em 2022 elas fizeram a transição do futsal para o futebol de campo, e desde então integram o Western Strikers, clube tradicional em South Australia.
“Um amigo nosso entrou em contato e falou sobre o Western Strikers estar em busca de novas jogadoras. Nunca botei meus pés num campo de futebol, sempre joguei futsal, mas pensei: vamos ver. Fomos fazer o teste, compramos as chuteiras, pela primeira vez calcei uma chuteira de futebol de campo, e deu certo!", conta Giovana.
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Giovana trocou as quadras pelo campo, e desde 2022 atua como atacante no Western Strikers em Adelaide. Source: Supplied
Antes nos gramados, Bella agora se aventura na comissão técnica do time feminino. A mudança veio por conta de uma lesão no ombro, mas ela conta que tem sido uma experiência interessante, ainda mais pela possibilidade de comandar a esposa em campo.
“Por conta de uma cirurgia no ombro, precisei ficar seis meses fora, e a comissão técnica me convidou pra voltar como assistente, enquanto a Gio está jogando. A gente brinca que quando a gente estaciona o carro no clube, passo a ser coach e aí ela não pode mais ficar brava se eu grito com ela. A gente chega no estacionamento, ela olha para mim e fala: me dá um beijo antes de você virar coach (risos)”, brinca a assistente técnica.
A gente chega no estacionamento, a Giovana olha para mim e fala: me dá um beijo antes de você virar coach.Bella Santiago, Assistente Técnica do Western Strikers, Adelaide
O futebol e a causa LGBTQIA+
O futebol na vida do casal tem ainda um espaço que vai muito além das quatro linhas. Para elas, o esporte é onde se sentem seguras e encontram a representatividade que a comunidade LGBTQIA+ tanto busca na sociedade.
“A gente tem liberdade no futebol. Sempre foi um espaço em que me senti muito segura, bem recebida. Como casal é um lugar que nos recebeu muito bem. O futebol nos permite ser quem a gente é, sem julgamento ou receios”, celebra Giovana.
Sempre me senti segura, bem recebida. O futebol nos permite ser quem a gente é, sem julgamento ou receios.Giovana Bruno, Atacante do Western Strikers, Adelaide
“O futebol feminino é muito aberto a isso. A maioria das jogadoras são da comunidade LGBTQIA+, o que é diferente do futebol masculino, que ainda tem muito a evoluir nesse sentido”, pondera Bella.
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Bella, assistente técnica no Western Strikers em Adelaide, diz que a maioria das jogadoras é da comunidade LGBTQIA+, o que gera um ambiente acolhedor para ela e Giovana. Source: Supplied
Ainda sobre representatividade, elas ressaltam a importância da Copa do Mundo Feminina na Austrália e o legado que o evento deixará para as meninas e mulheres que praticam esportes em geral no país.
“Quando a gente fala do esporte feminino profissionalmente, na Austrália e em todo lugar do mundo nós ainda precisamos de muito apoio. Já começamos a ver o efeito da Copa do Mundo sendo sediada aqui. Na comunidade se fala no assunto, eventos relacionados focados especificamente nas mulheres no esporte. O foco na mulher dentro do esporte foi colocado em pauta em várias modalidades. Ter essa Copa na Austrália vai trazer um impacto de alguns anos. É uma Copa que está fazendo história”, comemora Bella.
Ter essa Copa na Austrália vai trazer um impacto de alguns anos. É uma Copa que está fazendo história.Bella Santiago, Assistente Técnica do Western Strikers, Adelaide
“A mulher dentro do esporte traz diversidade e atenção para o esporte poder crescer. É a representação, seja como jogadora, assistente técnica, profissional da área administrativa, mídia, tudo isso ajuda. Conforme a gente vai se engajando mais com o esporte, mais a gente faz o esporte e o empoderamento feminino crescerem”, conclui Giovana.
Essa entrevista com a Bella e a Giovana integra a série de podcasts da SBS em Português , pela ocasião da Copa do Mundo Feminina de futebol de 2023 na Austrália e Nova Zelândia.
A série é produzida e apresentada por Mariana Gotardo e Edu Vieira, com apoio de Luciana Fraguas, Joel Supple e Manoel Costa.
Outros episódios da série:
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Futebol amador levado a sério: brasileira brilha nas quadras e campos de Melbourne
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