Destaques
- Copa do mundo feminina de futebol de 2023 tem início em 20 de julho na Austrália e Nova Zelândia
- Antonia é lateral da seleção brasileira e está na Austrália para disputar seu primeiro mundial
- A entrevista com a Antonia abre a série de podcasts "Lugar de mulher é em campo", que mostra a importância do futebol na vida de mulheres imigrantes
Disputar uma Copa do Mundo é o sonho de qualquer atleta de futebol, mas é uma realização para poucos. Imagina para quem nasceu e cresceu em uma cidadezinha de apenas 4 mil habitantes, no nordeste do Brasil, e teve que percorrer um caminho cheio de desafios para conseguir realizar esse sonho. Essa é a história da lateral Antonia, que joga na Priméra Liga da Espanha, pelo Levante, e aos 29 anos de idade foi convocada para o seu primeiro mundial vestindo a amarelinha.
Convocação para a Copa do Mundo
Nascida em Riacho de Santana, no interior do Rio Grande do Norte, Antonia superou diversos obstáculos e foi avançando em sua carreira, degrau por degrau, até chegar ao momento mais especial que uma atleta de futebol pode viver, a convocação para disputar uma Copa do Mundo.
“A convocação em si é um momento muito especial para qualquer atleta, ainda mais sendo a primeira vez. É o sonho de toda menina”, diz Antonia, que se emocionou e vibrou ao lado da família no momento da convocação.
A convocação em si é um momento muito especial para qualquer atleta, ainda mais sendo a primeira vez. É o sonho de toda menina.Antonia, Lateral da Seleção Brasileira Feminina
“Foram muitos anos batalhando junto com minha família, muitos momentos difíceis. Foram eles que estiveram comigo em todo esse caminho, então nada mais justo do que comemorar (a convocação) com eles. As pessoas não sabem a história por trás de cada atleta, então ali foi onde a memória bateu todos os flashes de todas as batalhas. Foi realmente muito emocionante”.
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Após receber homenagem, Antonia tira foto ao lado de moradores de Riacho de Santana, sua cidade natal, no interior do RN, com apenas 4 mil habitantes. Credit: Roniédson Silva
“Esse sonho não era só meu, era um sonho de todo mundo. Eu vim de uma cidade muito pequena, onde as chances de eu estar hoje aqui seriam pequenas, mas graças a Deus as oportunidades foram acontecendo, eu fui podendo abraçar. Então eu carrego a responsabilidade de realizar meu sonho e de outras atletas que tinham esse sonho e infelizmente não conseguiram”.
De pai para filha
O futebol está na veia da família Costa Silva. Seu Edilson, pai de Antonia, também foi jogador e passou para a filha a paixão pelo esporte, que segundo ela, nasceu de forma natural no decorrer dos anos, e veio então a descoberta do talento.
“O futebol aconteceu desde cedo, mas a paixão mesmo foi no decorrer da minha infância. Meu pai era jogador de futebol, tinha time. Ele foi me levando para os jogos, eu fui tendo contato com a bola, começaram a me colocar pra jogar na escola e foram percebendo esse talento".
Crescer em uma cidade pequena tem seus benefícios quando se é uma criança ávida por esporte. Com saudosismo, Antonia relembra seus tempos de Riacho de Santana e pontua que a educação foi fundamental no seu desenvolvimento.
“Foi uma infância muito boa. Por ser no interior eu era bem livre, me divertia muito jogando com meus amigos e amigas. Sempre tive o apoio da escola também. Participamos de jogos escolares e fomos campeãs muitas vezes. Fui percebendo que levava jeito e fui criando gosto, até perceber que realmente queria isso pra minha vida”.
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Sobre a infância em Riacho de Santana, no interior do RN, Antonia diz: "Foi muito bom crescer lá. Por ser interior, eu era bem livre, me divertia muito jogando com meus amigos e amigas". Source: Supplied
Desde que começou a levar o futebol a sério, a cada passo que dava, ela traçava um novo objetivo e uma nova percepção de que poderia ir mais longe. Ela então saiu do Rio Grande do Norte para São Paulo, onde as coisas aconteceram rápido até a primeira convocação, em 2017, para um período de treinos com a seleção.
“Eu dei mais um passinho na minha carreira quando fui morar em São Paulo junto com minha mãe. Eu tive a oportunidade de fazer a mudança do futsal para o campo e logo que joguei um campeonato tive a oportunidade de ser convocada. Muitas meninas estão há muitos anos e ainda não tiveram essa oportunidade, e eu com apenas um ano no campo tive a chance de ir para a seleção.”
Muitas meninas jogam há anos e ainda não tiveram essa oportunidade, e eu com apenas um ano no campo tive a chance de ir para a seleção.Antonia, Lateral da Seleção Brasileira Feminina
Após alguns anos no futebol brasileiro, onde jogou por Ponte Preta, Osasco, Corinthians, Iranduba e São Paulo, Antonia se transferiu para o futebol espanhol. Em 2020 foi para o Madrid CFF, onde ficou por três temporadas, e desde 2022 joga pelo Levante, também da liga espanhola. Mesmo com os inúmeros desafios, ela conta que se adaptou bem à vida de imigrante na Europa.
“A gente sabe que é um momento difícil, quando você sai do seu país, fica longe da sua família, da sua cultura, da sua língua. Um ponto positivo foi que a equipe que eu fui tinha bastante brasileira, então estava bem ambientada. Mas como eu gosto de desafios, falava para elas que devíamos tentar falar espanhol, para aprender. Então eu consegui me adaptar muito bem. A experiência na Espanha foi muito boa, tanto que eu decidi ficar lá por mais um tempo.”
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Antonia em campo pelo Levante, time que defende na Espanha, país onde vive desde 2020 e ao qual diz ter se adaptado bem. Credit: Levante/LUD Feminino
O futebol também proporciona a Antonia a possibilidade de criar laços que ultrapassam o tempo e as fronteiras. Uma das amizades que fez no esporte foi com a brasileira Tami Souza, hoje jogadora do Macarthur Bulls, de Sydney, e uma das entrevistadas da nossa série “Lugar de Mulher é em campo”. Tami nos contou sobre um presente que ganhou da Antonia durante a passagem da seleção brasileira pela Austrália, para um amistosos em 2022.
“Joguei com a Antonia em 2017 na Ponte Preta. Em 2022 eu fui ao jogo entre Brasil e Austrália em Sydney, e após a partida, eu cheguei perto das jogadoras e pedi a camisa da Antonia de presente. Ela correu até mim e me deu a camiseta, e eu me emocionei, não parava de chorar. Foi muito legal”, disse Tami à SBS.
Sobre esse reencontro, Antonia comenta: “A Tami participou do meu começo no campo, lembro de ter dado um passe pra ela fazer um gol num momento importante para a nossa equipe. Tinha perdido contato com ela e a reencontrei aqui na Austrália. Esses encontros realmente valem a pena. É isso que a gente guarda do futebol, as amizades, os encontros”.
A melhor do mundo na equipe
Uma das tantas realizações para Antonia é poder dividir o vestiário com Marta, a maior jogadora de todos os tempos, que chega para sua sexta Copa do Mundo e compartilha toda sua experiência com atletas como Antonia, debutando na competição.
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Antonia diz que a relação dela com a Marta é a melhor possível, já que a melhor jogadora do mundo está sempre aberta a ajudar e ensinar as companheiras de seleção. Credit: Lucas Figueiredo/CBF
Sempre falo com as meninas que devemos usufruir ao máximo de uma pessoa como ela (Marta), por toda experiência e tanta história vivida.Antonia, Lateral da Seleção Brasileira Feminina
Busca por mais espaço e direitos
A SBS destacou nas últimas semanas uma matéria da Revista Forbes que trouxe a comparação dos salários de Marta e Neymar. Segundo a revista, o craque do Paris Saint-Germain ganha quase 125 vezes mais do que a compatriota. Sobre o assunto, Antonia prefere evitar polêmicas e exaltar sua companheira de seleção, mas deixa claro que o futebol feminino segue na busca por espaço e direitos.
“A gente não busca igualdade. O que a gente busca é pelo nosso espaço, nossos direitos, aquilo que a gente acha que merece. Então quando a gente fala sobre a Marta ganhar menos ou mais, não é em referência a outra pessoa, mas pelo valor que ela é. Não é porque o Neymar recebe tanto que ela merece tanto. É pela história dela, por ter sido seis vezes a melhor do mundo. Acredito que o futebol feminino é isso, a gente busca os nossos direitos”.
Quando a gente fala sobre a Marta ganhar menos ou mais, não é em referência a outra pessoa, mas pelo valor que ela é.Antonia, Lateral da Seleção Brasileira Feminina
Campeã da Copa América de 2022
Embora seja sua primeira Copa do Mundo, Antonia já tem certa experiência com a amarelinha, tendo vestido a camisa da seleção por 26 vezes e sido peça importante na conquista da Copa América de 2022.
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Antonia segurando o troféu, quando a Seleção Feminina de Futebol foi campeã da Copa América, em 2022. Credit: Thais Magalhães/CBF
Toda emoção e orgulho de disputar uma Copa, quase foi por água abaixo por conta de uma lesão grave sofrida por Antonia em dezembro de 2022. Ela teve que passar por cirurgia no joelho direito, mas se recuperou a tempo de retornar à seleção e esbanja confiança de que o grupo está pronto e motivado para fazer história.
Vejo nosso grupo muito forte, com uma mescla de muitas coisas boas e essa vontade de querer fazer história e buscar a primeira estrela.Antonia, Lateral da Seleção Brasileira Feminina
“A lesão é o terror de qualquer atleta, ainda mais num momento tão importante como a Copa. Mas graças a Deus eu voltei dentro do prazo, pude estar bem. Então o sentimento agora é muito bom. Vejo nosso grupo muito forte, com uma mescla de muitas coisas boas e essa vontade de querer fazer história e buscar a primeira estrela. Acredito que o clima é o melhor possível, um time bem companheiro. A gente tem tudo pra fazer um grande mundial e fazer história”.
Essa entrevista com a Antonia integra a série de podcasts da SBS em Português , pela ocasião da Copa do Mundo Feminina de futebol de 2023 na Austrália e Nova Zelândia.
A série é produzida e apresentada por Mariana Gotardo e Edu Vieira, com apoio de Luciana Fraguas, Joel Supple e Manoel Costa.
Outros episódios da série:
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Futebol amador levado a sério: brasileira brilha nas quadras e campos de Melbourne
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