Futebol amador levado a sério: brasileira brilha nas quadras e campos de Melbourne

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Bruna com o troféu de campeã da Women's Series Futsal de 2023 do estado de Victoria com seu time Evolution FC. Source: Supplied

Bruna Oliveira divide sua rotina como jogadora de futsal e futebol de campo com seu emprego fora do esporte e coleciona prêmios e títulos como destaque nos clubes em que atua. "Lugar de mulher é em quadra, é em campo. Lugar de mulher é onde ela quiser”, diz.


Destaques
  • Bruna Oliveira joga desde os cinco anos de idade, conheceu o marido através do futebol e as melhores amigas quando jogava futsal na faculdade
  • Em Melbourne, onde mora há cinco anos, Bruna se destaca tanto nas quadras, com seu clube campeão da liga feminina estadual de 2023, quanto no campo
  • Essa entrevista com a Bruna integra a série de podcasts "Lugar de mulher é em campo", sobre a importância do futebol na vida de mulheres imigrantes
Vida de atleta semi-profissional não é fácil. É preciso ter outra ocupação para garantir o "sustento" e não há qualquer glamour ou uma estrutura ideal para que a pessoa receba os cuidados necessários e mantenha sua melhor performance.

A dedicação de uma parte considerável da rotina, com muitas horas por semana empenhadas ao esporte, não traz a compensação financeira merecida. Mas para muitos desses atletas, manter o contato com a atividade que amam e que leva tantas emoções às suas vidas, vale mais do que qualquer salário, prêmio ou fama.

Como em qualquer história de sucesso, a vida futebolística da brasileira Bruna Oliveira também tem seus desafios, mas ela enfrenta tudo com leveza e um sorriso no rosto.

Entre a quadra e o campo

Aos 29 anos, Bruna se divide entre as quadras, atuando pelo Evolution Futsal Club, e os campos, jogando pelo Bundoora United, nos campeonatos regionais do estado de Victoria.

“O futebol é muito importante para mim. Acho que não tenho nem como mensurar isso. Desde pequenininha eu jogo bola. Comecei a jogar com 5 ou 6 anos, conheci meu marido por meio do futebol, minhas grandes amigas jogando futsal na faculdade, tive a oportunidade de ir para a Copa na África do Sul por uma promoção que participei quando jogava futebol na escola. Então realmente o futebol tem um papel muito importante na minha vida e vai continuar tendo esse papel”, diz Bruna.
Comecei a jogar com 5 anos, conheci meu marido pelo futebol, minhas grandes amigas no futsal, na faculdade. O esporte é muito importante para mim.
Bruna Oliveira, Jogadora do Evolution FC e do Bundoora United, Melbourne
Nos campos e quadras de Melbourne, Bruna tem conquistado títulos e prêmios com sua paixão inegável pelo futsal e futebol. Em 2019 foi eleita a melhor jogadora do ano atuando pelo Pascoe Vale, no futsal, e conquistou com o time a FOZ Cup, tradicional competição estadual.

Em 2022 recebeu novamente o prêmio de melhor da temporada, dessa vez em eleição feita pelas atletas do seu time, o Evolution Futsal Club. No mesmo ano, fez parte do elenco do Essendon Royals, que conquistou o acesso à National Premier League de Victoria, no futebol de campo.

Sua conquista mais recente foi em 2023, quando levantou o troféu de campeã da Series Futsal, principal competição da modalidade no estado de Victoria.
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Bruna (de pé, à esquerda) junto com as companheiras do Evolution Futsal Club, time campeão de 2023 na Liga Feminina do estado de Victoria. Source: Supplied
Lesão e pausa inesperada

Mas nem tudo são flores. A brasileira se prepara agora para um dos momentos mais difíceis da sua carreira. Bruna sofreu lesão de ligamento no joelho, o terror de todos os atletas, em qualquer nível do esporte.

Para superar a situação, se apega ao amor ao esporte e o apoio de amigos que fez ao longo de sua jornada na Austrália, enquanto relembra seus momentos de alegria e sucesso com a bola no pé.

“Eu vou continuar amando o futebol, continuar acompanhando. Vou assistir aos jogos do meu time de futsal, e do meu time de campo. Para pessoas que praticam qualquer atividade física, qualquer esporte, a gente sabe que lesões podem acontecer. Agora eu estou focada na minha recuperação. Não é o fim do mundo”, conta Bruna, que já passou pela cirurgia de reconstrução do ligamento e espera voltar às quadras e campos em 10 meses.

“Aqui na na Austrália, eu e meu marido jogamos como amadores, mas nossa mentalidade, treinos e a forma que a gente se doa para o futebol, é como se fôssemos profissionais. Mas não temos acompanhamento médico, de fisioterapeuta e nutricionista, que os profissionais têm. Então infelizmente a gente acaba sobrecarregando nosso corpo nesse quesito. Mas tenho vários exemplos de meninas que passaram pela mesma lesão que eu tive e voltaram a campo, então logo, logo estarei de volta”.
Eu e meu marido jogamos como amadores, mas nossa mentalidade, treinos e a forma como nos doamos ao futebol é como se fôssemos profissionais.
Bruna Oliveira, Jogadora do Evolution FC e do Bundoora United, Melbourne
Remuneração no esporte amador

Quando ainda estava no Brasil, Bruna conta que jogava apenas por diversão. Mas desde que chegou à Austrália, passou a levar a sério o esporte e viu nele uma possibilidade de fonte de renda extra, algo que segundo ela era inimaginável enquanto vivia no seu país natal.
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Bruna diz que na categoria semi-profissional, em que atua, as atletas são pagas, coisa que no Brasil ela acredita que não aconteça. "Me surpreendeu de forma muito positiva", afirma. Source: Supplied
“No Brasil nunca joguei pensando que seria profissional e que poderia viver de futebol. Quando eu vim para a Austrália, consegui ver a diferença de estrutura. O que eu sinto aqui é que o futebol feminino é até maior que o masculino. O nível das meninas que jogam aqui é muito alto. Na categoria que eu jogo, semi-profissional, as meninas são pagas, é uma coisa que no Brasil acredito que não existe. É uma coisa que me surpreendeu de forma muito positiva. Aqui tem muitos clubes onde o time feminino é o foco, tem muito mais incentivo e possibilidades”, explica.
Na categoria que eu jogo, semi-profissional, as meninas são pagas, algo que no Brasil acredito que não exista.
Bruna Oliveira, Jogadora do Evolution FC e do Bundoora United, Melbourne
“Tenho 29 anos, nunca joguei profissional e nem semi-profissional no Brasil, e aqui eu recebo pra jogar campo. No futsal, acabei de ser campeã da liga. É algo que não imagino que ia acontecer no Brasil”.

Apoio dentro de casa

Para se dedicar à carreira nas quadras e gramados, Bruna conta com o apoio do marido, Henrique Pimenta, também atleta semi-profissional. Foi Henrique que encontrou o primeiro time para Bruna, antes mesmo que ela chegasse à Austrália.
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Henrique Pimenta, marido e um dos maiores apoiadores de Bruna no esporte, também joga futsal e futebol em Melbourne. Source: Supplied
“Meu marido fala que é meu empresário (risos). Ele veio para a Austrália quatro meses antes de mim. Antes que eu chegasse, ele já me mandou mensagem dizendo que arranjou time pra mim, para eu não esquecer de trazer o tênis de futsal. Eu cheguei, e acho que dois dias depois já tinha jogo. Comecei a jogar, gostei do treinador, das meninas e fiquei”, lembra a jogadora.
Meu marido diz que é meu empresário (risos). Ele veio para a Austrália antes de mim. Quando cheguei, já tinha arranjado time pra eu jogar.
Bruna Oliveira, Jogadora do Evolution FC e do Bundoora United, Melbourne
“A gente se conheceu através do futebol. A Bruna no esporte vem se desenvolvendo cada vez mais. Aqui em casa eu sempre falo que a craque é ela. Se você vier aqui, vai ver que a maioria dos troféus, medalhas, é tudo dela (risos). Mas a importância maior que o futebol trouxe para ela foi o ciclo de relações. O futebol abre muitas portas e uma delas é te possibilitar fazer amizades ao longo do caminho”, nos conta Henrique, que assim como Bruna, joga futsal e futebol de campo.

Das quadras e campos para a vida

Sobre as amizades que fez a partir do esporte, Bruna ressalta que a prática do futsal e do futebol foi muito importante na decisão de ficar na Austrália. Foi através dos times em que jogou que ela criou seus primeiros laços no país, que a ajudaram na sua adaptação.

“Quando eu cheguei na Austrália foi difícil fazer amigos. É um momento que a gente fica bem solitário. Quando eu entrei no time, aos poucos fui conhecendo melhor as meninas e desenvolvendo as amizades, e esse foi um dos motivos que me fez querer ficar no país. Agora que me machuquei, as meninas me compraram flores, me deram presente, me mandaram mensagem. Muito mais do que um time, participar de esportes coletivos é importante para o seu desenvolvimento pessoal, saber se relacionar com pessoas diferentes, e até com frustrações, imprevistos. Esportes coletivos são muito importantes”, pontua Bruna.
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Bruna diz que as amizades que fez dentro das quatro linhas foram fundamentais para que ela se sentisse acolhida e decidisse ficar na Austrália. Source: Supplied
Jornada tripla de trabalho

A brasileira divide sua rotina como atleta com seu trabalho em uma agência de imigração, e conta que lida bem com a vida tripla, com apoio no escritório e a organização da sua agenda para treinos e jogos.

“O meu chefe adora futebol, então isso ajuda muito (risos). Eu sei que o que me possibilita uma vida na Austrália é o meu emprego, então das 8h às 17h eu sou a Bruna que trabalha no escritório, no computador, atendendo os clientes. Os treinos e jogos são todos à noite. Meu treino de campo é das 19h às 21h, nunca atrapalhou meu trabalho, e os jogos sempre são nos finais de semana. No futsal jogo às quarta-feiras à noite. Às vezes acordo cansada no dia seguinte, mas faço um gelinho enquanto trabalho. Então nunca foi uma questão que me atrapalhou muito. Eu sei que tenho muita sorte de conseguir balancear isso tão bem”.
Meu chefe adora futebol, então isso ajuda muito (risos). Meus treinos e jogos são à noite ou no final de semana, então consigo balancear a rotina.
Bruna Oliveira, Jogadora do Evolution FC e do Bundoora United, Melbourne
Legado da Copa do Mundo na Austrália

Fã de futebol também como espectadora, Bruna nos conta que tem acompanhado a Copa do Mundo de perto e torce para poder aproveitar o legado que a competição deixará para o país.

“A gente vê os números de ingressos vendidos, times, estádios, toda divulgação. Espero que isso faça com que o futebol feminino seja mais respeitado e divulgado, mais assistido ao redor do mundo. A minha expectativa é que depois da Copa vire essa chave para o futebol feminino. Lugar de mulher é em quadra, é em campo. Lugar de mulher é onde ela quiser”.

Essa entrevista com a Bruna integra a série de podcasts da SBS em Português , pela ocasião da Copa do Mundo Feminina de futebol de 2023 na Austrália e Nova Zelândia.

A série é produzida e apresentada por Mariana Gotardo e Edu Vieira, com apoio de Luciana Fraguas, Joel Supple e Manoel Costa.
Para acompanhar a série, siga ano  e ouça . Escute a ao vivo às quartas-feiras e domingos.

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