A menina que veio do mar às 3h20 da madrugada de terça-feira, 10 de dezembro, dia dos Direitos Humanos! O veleiro Trotamar III, de uma ONG alemã, o coletivo Compass, que se dedica à deteção e salvamento de migrantes náufragos no mediterrâneo.
Nestes últimos meses o Trotamar com a tripulação têm usado como base em terra, ou o porto de Siracusa, na ilha da Sicilia, ou o de Lampedusa, mais para dentro do mediterrâneo.
Esta ONG Compass tem pontos de apoio e alerta na Tunísia. Servem o esforço de verificação de que as barcaças que saem da costa da Tunísia chegam a um lugar relativamente seguro no destino escolhido, na Europa.
A rota mediterrânica mais preferida – pelas vagas migratórias – é a que vai de Sfax, na Tunísia, a Lampedusa, já na muito desejada Europa, na Itália. São 102 milhas marítimas, o que equivale a uns 190 quilômetros.
Na tarde de terça-feira, a alemã Katija Tempel, da tripulação do Trotamar, constatou que três das embarcações que a antena humana em Sfax tinha alertado terem zarpado, faz agora uma semana, nenhuma delas tinha sido detetada a chegar a algum destino europeu.
A tripulação do Trotamar decidiu avançar para o que escolheram como missão, apesar de muitos atritos com as autoridades italianas, para navegação em busca e resgate.
O mar estava muito encapelado, com ondas de 5 a 7 metros. Eles navegaram na noite muito fria com radares e projetores potentes a tratar de iluminar o máximo possível de espaço marítimo.
A noite avançava e nada era detetado, até que acontece o acaso com história de milagre. Apesar do som contínuo do então marulhar naquele mediterrâneo, 10 milhas para sul de Lampedusa, Matthias, o único tripulante em posição de vigia junto ao mastro do Trotamar, escutou o que lhe pareceu ser um grito vindo do mar.
Deu o alerta, pararam o motor, intensificaram a rotação dos projetores. Àquela hora da madrugada de inverno tudo é uma massa escura: o mar e o céu confundem-se, tudo negro. Mas perceberam que a 100 metros estava alguma coisa a flutuar. Aproximaram-se mais, e sim, havia gente.
Uma criança, uma menina agarrada a 2 pneumáticos, sobrevivia no mar, gelada a tremer de modo incessante. Não conseguia falar, pouco reativa, hipotermia extrema, mas viva. Calculam que não resistiria muito mais no mar.
Claro, resgataram-na, tem treino para primeiros socorros. Ativaram a emergência, navegaram com toda a força para a terra mais perto, o porto de Lampedusa. Atracaram às 5h da manhã. Uma ambulância com um médico estava à espera.
No poliambulatório de Lampedusa, logo na área do porto, estabilizaram. Ela continuava confusa. Perceberam que ela tinha perdido a noção do tempo. Contou que estava há 2 dias na água. Quem conhece o mar, entende que seria impossível sobreviver dois dias dentro daquele mar.
Mas o relato tinha partes que batiam certo. Tinha partido na quinta-feira de Sfax. Era a etapa final de uma odisseia iniciada 3 semana antes, na terra dela, Serra Leoa, pequeno país da África atlântica, entre a Guiné e a Libéria.
O pai, pegou nela e no irmão e deu caminho ao sonho de migrarem para a Europa. Houve um passador, um traficante de pessoas, a organizar a travessia do Mali, o deserto argelino, até que chegaram à Tunísia. Sfax é o entreposto habitual. Há policia para barrar os embarques, mas há muito como lhes dar a volta.
Os 3 tiveram embarque decidido para, faz hoje 8 dias, num barco em metal, antigo pesqueiro adaptado para transportar pessoas. A menina, que se diz chamar Yasmine, e o irmão, foram dos primeiros a embarcar, quando já havia 45 pessoas a bordo. O patrão do embarque parou as entradas. O pai de Yasmine ficou em terra, todos com telemóvel, combinaram juntar-se em breve em Lampedusa.
A menina, que diz ser Yasmine, contou aos médicos e à psicóloga que na terceira noite no mar a barcaça deconjuntou-se e tombou toda a gente no mar. Ela conta que muita gente agarrou-se ao que podia para flutuar. Havia muitos pmeumáticos, alguns de pneus de camiões a fazer de boias. Ela agarrou-se a 2, conseguiu mesmo atar um braço a um deles.
O irmão também. Durante algumas horas, foi tendo o irmão e outros dos embarcados por perto, mas a ondulação foi separando-os. Yasmine conta que no que teria sido segunda-feira, ficou sozinha, até ser resgatada na madrugada de quarta-feira.
Os outros 44 dos 45 embarcados estão desaparecidos. Conjetura-se que são mais 44 pessoas com o mediterrâneo como sepultura. Também não se sabe dos embarcados em Sfax em outras 2 barcaças que também não chegaram – uma delas carregada com sírios que nem terão sabido que o regime mudou.
A psicóloga Francesca Saccomandi, da Save the Children, está a cuidar de Yasmine em Lampedusa. A tripulação do Trotamar está de volta ao mar, com outros barcos de outras ONGs.
Estimam que só neste ano já terão naufragado por ali uns 1500 migrantes que embarcaram em Sfax e não se deu algum sinal de que tenham chegado. Mas há muitos que conseguiram caminhar na terra desejada. Destes, uns 20 mil foram devolvidos pelas autoridades italianas. Uns para a Tunísia, outros para a Líbia.
Para Yasmine, a menina vinda do mar, está prometido acolhimento. Uma organização ecumênica já localizou o pai e está a tentar junta-los.
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